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sexta-feira, 30 de setembro de 2011

O quadro da esquerdização forte e galopante da Ibero-América





Após 12 anos de regime chavista, a Venezuela é, ao lado de Cuba, a nação do continente mais prostrada por uma terrível crise decorrente da aplicação do socialismo. Seu veneno vai penetrando em quase todas as demais nações e produzindo nelas outras crises menores que, se não forem detidas, crescerão no rumo daquelas que as suscitaram. O que ficaria de pé na Ibero-América com uma dezena de incêndios simultâneos em tantos outros países?
Alfredo Mac Hale
O quadro da esquerdização forte e galopante da Ibero-América, descrito por nós várias vezes nos últimos anos, nas páginas de Catolicismo, recentemente acentuou-se muito, impondo profundos receios pelos seus efeitos sobre o Continente.
Numerosos e expressivos são os fatos nesse sentido: a substituição, na Colômbia, do notório anticomunista Álvaro Uribe – que enfrentou com denodo a escalada guerrilheira e a prepotência chavista – por Juan Manuel Santos, até então seu mais fiel seguidor e que, uma vez eleito, vem se mostrando muito mais dialogante e concessivo com a esquerda que seu antecessor; a vitória, sob os auspícios de Lula da Silva e sem autêntica oposição, de Dilma Roussef para a Presidência do Brasil, através da qual se procura alcançar uma hegemonia sem contrapeso do PT neste imenso País; a eleição para a Presidência do Peru de Ollanta Humala, que durante muitos anos ostentou uma posição marxistoide, atenuada um tanto entre o primeiro e o segundo turno da referida eleição, com a finalidade exclusiva de ganhá-la, iludindo a oposição e a opinião pública; a forte agitação que sacudiu o Chile nos últimos meses, debilitando e colocando em dificuldade o governo de Sebastián Piñera, que não dispõe de maioria parlamentar nem condições de recorrer sistematicamente a medidas de força para manter a ordem pública; a perspectiva de que no México, para substituir o atual presidente Felipe Calderón, seja eleito no próximo ano algum dos líderes do Partido Revolucionário Institucional (PRI), como o ex-governador da capital, Enrique Peña Nieto, com o que se reiniciaria o domínio dessa agrupação fortemente socialista e pouco apegada às normas do Direito; o risco de a Presidente da Argentina, Cristina Fernández de Kirchner, vir a reeleger-se nas eleições de fins de outubro, reiniciando assim o galope rumo à esquerda.
Sem temor a exagero, poderíamos dizer que, embora quase tudo se tenha agravado, a situação continental não se tornou desesperada, porque, por motivos alheios à vontade da esquerda, seus líderes se viram forçados a se mostrarem “moderados” nas vésperas das eleições, sob pena de perdê-las. Foi o que se viu, por exemplo, de modo gritante, no Brasil e no Peru. Entretanto, como veremos, passadas as eleições – e até mesmo antes de assumir o poder – os “moderados” as vezes voltam a assumir discurso radical. Nessas condições, se não houver reações vigorosas em todo o Continente, os “moderados” se radicalizarão, e os que já são radicais terminarão dominando.
Observa-se de outro lado, como regra geral, as forças de esquerda mostrarem-se implacáveis opositoras em relação aos que não partilham de sua orientação, enquanto estes, para não ser qualificados de reacionários, procuram ser condescendentes e neutros em face do adversário. Beneficiam assim a esquerda, porquanto a opinião pública fica com a sensação de que de um lado há segurança e de outro debilidade, e em consequência a nação é arrastada rumo à esquerda, embora a maioria não esteja de acordo com essa tendência.
Excluindo de nossa análise o Brasil, pelo fato de sua situação ser bem conhecida dos leitores de Catolicismo, cuidaremos aqui da situação de algumas nações sul-americanas, deixando outras para setembro, a fim de apresentar um quadro de conjunto, se não exaustivo, pelo menos ilustrativo.
Após 12 anos de governo que poderia se qualificar de semi-ditatorial, a doença de Chávez pode colocar em xeque seus planos expansionistas

Venezuela, na vanguarda rumo ao caos
Como já vimos em outros artigos, o protótipo desta situação é a Venezuela de Hugo Chávez, que há 12 anos estabeleceu ali um regime a respeito do qual o mínimo que se pode dizer é ser semi-ditatorial. Eis um rápido elenco dos epítetos aos quais o incendiário presidente faz jus: cúmplice e promotor da tirania cubana, marxista obsessivo, opressor de todas as classes, demolidor da riqueza, do bem-estar e da sã convivência dos venezuelanos; promotor da violência política e subversiva, tanto na Venezuela como em nações vizinhas; ufano das expropriações e dos confiscos maciços; brutal e sem escrúpulos, apesar de apresentar-se às vezes bonacheirão; desrespeitador das leis, inclusive das ditadas por ele; camaleão, declarando-se ora “democrático”, ora revolucionário, sua norma suprema é o arbitrário jactancioso e intempestivo do momento.
É claro que os delírios autolaudatórios do ditador, amiúde muito próximos da paranóia, por serem de intensidade variável, são tomados pela população venezuelana de modo também variável: às vezes com profunda recusa por seus incontáveis abusos, mas com frequência também de modo jocoso e burlesco, pelas expressões ridículas e grotescas que Chávez adota. Com isso se diluem a indispensável seriedade e a consequente combatividade da oposição.

Chávez dilapidou a riqueza pretrolífera da Venezuela, usando o dinheiro para promover a sua “revolução bolivariana” por toda Ibero-América

Em outros termos, o déspota socialista sabe para que rumo vai: o do comunismo sem dissimulações. E não dá importância às razões – leis, princípios, normas de convivência civilizada, etc. – para deter-se. De modo que avança sem cessar, retrocedendo somente quando é forçado. Enquanto isso a oposição, fracionada e sem suficiente zelo pelas normas violadas, sem afirmatividade sobre o tipo de sociedade que ela deseja em contraposição ao desvario governista, não tem um consenso fogosamente contrário à demolição. Limita-se então a idéias comuns às várias forças antichavistas, o que se traduz em afirmações frouxas de princípios evidentes e não atrai o apoio do restante da opinião pública.
Caso não se tenha uma visão das proporções do incêndio propagado por Chávez, nem dos perigos dele decorrentes, não se terá uma idéia clara dos sacrifícios que é preciso fazer para apagá-lo. Sem isso não se arrastará senão uma fração dos que poderiam combatê-lo, mobilizando-os apenas parcialmente para a magna empresa.
Iniciando pelo aspecto econômico, e para dar dele uma noção cabal, vale a pena recordar que nos últimos 12 anos o regime chavista dilapidou centenas de bilhões de dólares, mais que a soma do que o país auferiu em várias décadas com o petróleo! Segundo cifras do Banco Central da Venezuela, os ingressos petrolíferos somam 700 bilhões de dólares desde que Chávez assumiu a presidência. E “isso excede os ingressos petrolíferos da Venezuela dos 25 anos anteriores” (cfr. André Oppenheimer, O milagre venezuelano, “El Nuevo Herald”, Miami, 30-6-11). Pois bem, uma vez dilapidada essa imensa riqueza, a Venezuela está em situação muito pior do que no começo do processo.

Mulher protesta em Caracas, depois que o governo de Chávez anunciou o fechamento de 34 emissoras de rádio e dois canais de TV por supostas irregularidades administrativas.

Soma-se a isso a destruição e deterioração do aparelho produtivo, devido aos confiscos, à agitação, ao coletivismo, às torpezas da burocracia socialista, à galopante delinquência que domina o país, à inflação mais alta da América, à falta de inversão – pois ninguém está disposto a arriscar mais recursos que os já comprometidos –, ao caos dominante em todos os âmbitos; só para nos referirmos ao lado material.
Para além deste, cumpre considerar as energias gastas pelo país num conflito estéril e intérmino; as frustrações que isto causa em todos os venezuelanos de bem e as audácias demolidoras a que se sentem convidadas pela impunidade as hordas chavistas, incluídas as milícias; o êxodo de talentos e de capitais ao exterior por falta de futuro no país; o desânimo das forças vivas, a multiplicidade dos conflitos, a abundância e gravidade dos perigos; a inoperância – quando não a cumplicidade com o delito – da administração da justiça e o amordaçamento dos meios de comunicação para privar a opinião pública de informação e de meios para se expressar, etc.
Tal panorama comporta aspectos que mais parecem um pesadelo surrealista que a vida de uma nação real. É o que se deu com a rebelião violentíssima das máfias de presos nos cárceres, que mantiveram a imensa maioria dos condenados como reféns durante várias semanas sem que o regime atinasse a encontrar uma solução. São os contínuos cortes de luz elétrica, em diversas regiões do país, atribuídos pelo governo a problemas climáticos quando é óbvio que a causa é sua própria incompetência técnica e administrativa. É a escalada delituosa mais alta da América do Sul, com 48 assassinatos anuais a cada 100 mil habitantes. É a dilapidação dos fundos públicos em benefício do chavismo, para que este domine a nação e se expanda pelo Continente.
Para a Revolução, uma surpresa e muita incerteza
Os protestos na Venezuela fazem parte do dia-a-dia da população

Esse era, até há pouco mais de um mês, o panorama da vida venezuelana, por efeito do regime que a oprime. De repente, após alguns vai-e-vens de desinformação, deu-se primeiro o rumor e depois a notícia da doença que afeta Hugo Chávez. Este, pelo estado de abandono em que se encontra o sistema hospitalar público venezuelano, bem como pelo temor e desprezo que vota às clínicas privadas de seu país, optou por fazer-se examinar e operar em Cuba, a Meca dos xiitas do comunismo sul-americano falsamente apresentada pelas esquerdas como possuidora de uma medicina “digna do Primeiro Mundo”.
Entretanto, após duas cirurgias – uma, segundo tudo indica, errada, feita por cubanos, e outra, na aparência mais certeira, que durou seis horas e foi realizada pelo cirurgião espanhol que cuidou da ruína ambulante Fidel Castro –, foram dados à publicidade um diagnóstico – câncer –, e um tratamento em relação ao qual o regime não especifica quase nada, omitindo que órgãos foram afetados, qual o tempo de desenvolvimento do tumor, se ele atinge ou não outros órgãos, que perspectivas existem, etc.
As hipóteses dos observadores, tanto sobre o presente quanto ao futuro, são as mais variadas. Entretanto, muitos especulam sobre o que esperar do círculo próximo de Chávez, cujos membros têm em comum uma notória falta de liderança, uma vez que o Führer afastou seus possíveis competidores; total falta de preparação para governar, claro fanatismo marxista e suposta incondicionalidade diante o líder, sem que se possa descartar, não obstante, que se venham a produzir entre eles, nos momentos cruciais, enfrentamentos dos mais brutais para resolver a sucessão.
Assim, o mais provável é que Chávez, morrendo ou se submetendo a um duro tratamento de rádio ou quimioterapia – depois de um período de tensões e de dúvidas –, seja substituído provisória ou definitivamente, seguindo o modelo cubano, por seu próprio irmão Adão; ou por algum dos membros da cúpula militar designada por Chávez, todos de sua tendência ideológica e seus incondicionais. Com isso, é provável que tudo termine em guerra civil, ou que a resistência seja esmagada pelas Forças Armadas somadas às milícias bolivarianas – e quiçá aos brutais contingentes castristas.

Hugo Chávez escuta atentamente Castro, durante sua estadia para tratamento de um câncer em Havana

O dito anteriormente é muito provável, porque os ditadores marxistas e seus sequazes vivem obcecados com conspirações contra eles, pois sabem que a opinião pública lhes é adversa. E como imaginam que as conspirações para matá-los ou destituí-los se produzem continuamente, também maquinam de maneira permanente para esmagar tais conjurações. De modo que são contínuas as manifestações ameaçadoras dos dirigentes chavistas, muitos dos quais anseiam pelo dia em que possam dar rédea solta a seus ódios.
Em todo caso, à margem do enfrentamento esquerda-direita, todo o restante das atividades de um Presidente – ou seja, o que é propriamente governo, administração e liderança do país – continuará muito provavelmente abandonado, como esteve durante o governo Chávez, ou inclusive pior. Com o efeito cada vez mais intenso de um auge de desestruturação e de uma verdadeira derrocada nacional, o que não significa que o regime fique sem forças para continuar a demolição, as agressões e as perseguições.
A este respeito, o jornal “Clarín” (10-7-11), de Buenos Aires, no artigo intitulado Literalmente, a Venezuela se descasca, fornece detalhes muito expressivos: “A Venezuela tem um déficit de dois milhões de casas. Os críticos de Chávez dizem que seu desempenho na construção de moradias – menos de meio milhão de novas unidades desde que assumiu em 1999 – é pior que o de seus antecessores. [...] A crise mais inquietante é o declínio do modelo econômico estatista, porque há um estancamento do aparelho produtivo e uma extrema dependência de produtos importados. [...] O incessante aumento dos preços reduziu substancialmente o poder aquisitivo dos venezuelanos, que desde 2007caiu 14,5%. [...] A dívida externa triplicou, de 30 bilhões de dólares em 1999 a uma que supera atualmente os 120 bilhões”.
A Venezuela vive, em síntese, na confluência de quase todas as catástrofes, com um poder supremo ao mesmo tempo totalitário e inepto; venerado e desprezado; olímpico em suas atitudes jactanciosas, mas incapaz de resolver as crises e catástrofes que ele mesmo provocou. Chávez é implacável em atribuir suas próprias culpas a quaisquer de seus súditos, de modo a poder afirmar-se como uma espécie de gênio incompreendido. Isto até que a derrocada geral o sepulte na ruína dos mitos que construiu.
Começa surgir a preocupação no País pelo aumento da insegurança e o recomeço de ataques da guerrilha a pequenas cidades. A promessa de continuidade da política de Uribe, base do apoio eleitoral a Santos, parece ter ficado nas urnas...

Colômbia: da confrontação à aliança com Chávez
Álvaro Uribe, esq., cumprimenta seu sucessor, Juan Manuel Santos

Esboçado este panorama, resta ver quanto e como esse fenômeno penetrou nos demais países, inclusive naqueles que lhe são contrários. Comecemos pela Colômbia, a nação que melhor resistiu a Chávez durante oito anos e na qual ele vai agora obtendo avanços inesperados e deploráveis.
Como vimos, o enfrentamento protagonizado entre Álvaro Uribe e Chávez cedeu rapidamente lugar às relações amistosas estabelecidas por Juan Manuel Santos com o caudilho caribenho. Estas se tornaram públicas no gesto simbólico havido entre ambos com o ex-guerrilheiro sandinista Daniel Ortega, atual presidente da Nicarágua, e Porfírio Lobo, Presidente de Honduras, quando do regresso a este país do malogrado Manuel Zelaya.
Eles procuravam dar assim por encerrada a crise em Honduras de 2010, afirmando que se tratou de um simples golpe de Estado, omitindo pura e simplesmente as ilegalidades e violações da Constituição praticadas por Zelaya, responsável pelo conflito. Assim, abre caminho para se repetir as manobras de Chávez a fim de submeter Honduras.

O simbólico gesto de Santos estendendo a mão para o presidente da Venezuela Hugo Chávez, gerou profunda desconfiança em amplos setores da opinião pública colombiana
A Corte Suprema de Justiça da Colômbia vem emitindo sentenças sumamente questionáveis, quer do ponto de visto do Direito, quer do mero bom senso, ou ainda da segurança do país

Após essa reunião, o secretário-geral da OEA, o socialista José Miguel Insulza – que também tentou impedir que Honduras escapasse do domínio chavista –, apresentou-se dizendo que incumbia à população hondurenha determinar “se é necessário castigar Roberto Micheletti”, o presidente que substituiu Zelaya.
Pois bem, os castigos a serem aplicados aos que os mereçam, ou estão previstos na Constituição e nas leis, ou não passam de vulgares injustiças e ilegalidades; e não é estimulando o povo a uma vingança que se resolve qualquer problema. Essa insólita atitude de Insulza, além de desqualificá-lo para o cargo que ocupa, denota um verdadeiro contubérnio para expandir o poderio de Chávez na América Central. É uma temeridade do secretário da OEA provocar o povo hondurenho para que, arrogando-se faculdades judiciais que não possui, desencadeie conflitos de alcance imprevisível!

O líder das FARC, Raúl Reyes, poucos dias antes de morrer no surpreendente ataque do exército colombiano

Mas voltemos à Colômbia. Seu principal problema é o progressivo desmantelamento do esquema de segurança estabelecido por Álvaro Uribe, com a diminuição dos efetivos mobilizados e dos orçamentos para enfrentar a guerrilha. Em decorrência disso aumentaram consideravelmente os índices de atentados e sequestros praticados por esta. Também vários altos chefes militares que se destacaram no passado por sua efetividade no combate à guerrilha foram transferidos para a reserva, aumentando a ousadia dos subversivos e desalentando as tropas mais valorosas a se empenharem por inteiro na defesa da Pátria.
As consequências desta política não se sentirão obviamente de imediato, mas quando isso acontecer, haverá muitos efeitos irremediáveis. Por exemplo, a sensação de segurança da população, que havia melhorado notavelmente entre 2002 e 2010, hoje já baixou, não aos ínfimos níveis de 1994-2002, mas parece rumar para eles...
A história da Colômbia dá conta de centenas de milhares de mortos em conflitos internos, ao longo de meio século. Mas atingiu auges até então inéditos com a guerrilha marxista e sua articulação com o narcotráfico. Isso, que até 2002 parecia um problema sem solução devido à frouxidão contínua de sucessivos governos, inverteu-se na gestão de Uribe. Portanto é muito grave que o mal esteja renascendo. E se compreende a preocupação de grande parte do país, a qual espera que o governo não dê crédito às falsas promessas marxistas.
A Colômbia vai sendo, por outro lado, afetada a cada dia mais pelo que já muitos chamam de “ditadura judicial”. Com efeito, interpretando de forma abusiva e a seu bel-prazer as disposições constitucionais, as altas Cortes de Justiça vêm emitindo sentenças sumamente questionáveis, quer do ponto de visto do Direito, quer do mero bom senso, ou ainda da segurança do país. Uma delas foi a aprovação, evocando a liberdade individual, de vários tipos de aborto que estavam proibidos por lei; outra foi a declaração de que os dados encontrados nos computadores do guerrilheiro Raúl Reyes não terão valor jurídico, apesar de vários organismos estratégicos de nível mundial terem atestado o evidente valor dos mesmos e sua inquestionável autenticidade.
Mas há outras sentenças ainda mais questionáveis. São as que facultam à Fiscalia poderes para lançar graves acusações contra altos oficiais do Exército, capazes de desencadear processos judiciais que podem levá-los a sentenças condenatórias por dezenas de anos de cadeia, enquanto muitos guerrilheiros que cometeram crimes hediondos participam da política ativa sem que ninguém os perturbe.
Como consequência, começam a surgir casos de militares que optam por uma posição neutra, por não aceitarem que o heroísmo na frente de batalha contra a guerrilha seja retribuído pelo establishment com investigações, castigos e ações judiciais; disposições que podem ter efeitos funestos no Exército e, portanto, no futuro do país, pois uma nova irrupção em grande escala do terrorismo na Colômbia repercutiria em todas as nações vizinhas.
O Peru é um dos maiores países pesqueiros do mundo. Humala abrirá as ricas costas peruanas para os barcos russos?
Olanta Humala,
novo presidente do Peru

Um novo Chávez andino no Peru?
Os jornais deram grande cobertura ao escândalo das tratativas do irmão de Humala na Rússia

No tocante ao Peru, já mencionamos a vitória de Ollanta Humala nas últimas eleições, obtida graças a uma manobra de aparente moderação do candidato, de seus familiares e dos partidos políticos que o apoiaram ou lhe são próximos.
Entretanto, como a frente que o apoiava era heterogênea, não tardou em haver discrepâncias entre possíveis membros do futuro governo. Mas Humala esforçou-se para se apresentar como ameno, dialogante, distendido, entrevistando-se com presidentes de diversos países, dando a impressão de que seu passado de esquerdismo radical e sua mentalidade socialista eram coisas superadas. Sem embargo, a menos de três semanas de sua posse, ainda não indicou os nomes dos principais ministros, de tal modo que pouco se pode dizer de concreto sobre a política que aplicará.
Isso não obstante, aconteceu de repente algo que para alguns terá sido desconcertante, embora para outros parecerá simplesmente um sinal: enquanto Humala, em plena “operação tranquilizadora”, se encontrava em Washington, no outro extremo do mundo – precisamente em Moscou –, uma notícia dava conta que o “representante especial do presidente eleito peruano”, seu irmão mais novo Aléxis Humala, visitava altos funcionários do Estado russo, inclusive o chanceler e o ministro de defesa, a cúpula da gigantesca empresa de gás Gazprom e empresas de pesca, com os quais ele tratou de inversões, compras, convênios e negócios no Peru. Sobre isso até o momento ninguém havia falado, nem dado algum detalhe ou explicação coerente.
As expressões de estranheza e repúdio no âmbito peruano foram obviamente numerosas e eloquentes. É compreensível, pois o país tem péssima experiência de acordos pesqueiros com a Rússia durante a ditadura militar de esquerda (1968-1980), na qual numerosos barcos russos pescavam abusiva e predatoriamente nas águas nacionais, tendo custado muitos esforços encerrar o convênio.
Se bem seja verdadeiro que naquela época a União Soviética ainda não tinha sido derrubada, também é certo que os atuais hierarcas do Kremlin nutrem imensa nostalgia por esses tempos. Pois bem, nestas condições surgem sintomas de que se tramam novos tratados que podem dar margem à repetição de tais abusos. E isto a partir da própria família do presidente eleito, e havendo versões de que era por encargo dele!
A agrupação política que apoiou Ollanta Humala apressou-se em excluir de suas fileiras o irmão deste, a quem não sabe como qualificar: se como gestor administrativo, aventureiro ou farsante. Mas quem deveria mostrar-se mais contrariado seria o próprio Ollanta, que guardou até o momento completo e inexplicável silêncio. Enquanto isso os esquerdistas mais radicais se esforçavam em elogiar a suspeita iniciativa.
Evidentemente, o perigo maior é que se estabeleça no território peruano uma “cabeça de ponte” do imperialismo russo, o qual se mostrou bastante amigo de Chávez, Lula e outros próceres da esquerda ibero-americana, e está ansioso por obter concessões das nações do Continente através de tentadoras ofertas, que se tornam por isso mesmo suspeitas.
Se a tentativa é grave, fazê-la secretamente é pior, pois não é verossímil que a chancelaria russa receba emissários estrangeiros sem credenciais, ouça ofertas que não contam com a aprovação da cúpula do governo que os envia, e se façam em retribuição propostas sem conhecer as disposições da outra parte em aceitá-las.
Ademais, caso em algum país ibero-americano se estabeleça uma “cabeça de ponte” russa, não será profundamente afetada apenas a nação hóspede, mas todo o Continente. E os eventuais conflitos entre os países maiores e poderosos terão inevitavelmente um eco e desdobramentos entre nós.
Índios protestam nas ruas centrais de Buenos Aires

Foto: Luis Guillermo Arroyave

Os oito anos de domínio kirchnerista sobre a política argentina foram na verdade um domínio sem contrapeso, exercido muitas vezes com a brutalidade decorrente da aliança dos Kirchner com as poderosas centrais sindicais
Presidente argentina Cristina Fernández de Kirchner

Argentina na senda prepotente do peronismo radical
Voltemos o olhar para outra importante nação, cujo destino está sendo jogado em nossos dias: a Argentina. Haverá ali uma eleição presidencial no próximo dia 23 de outubro, precedida por primárias em 14 de agosto, quando os partidos de oposição elegerão seus candidatos para competir com a presidente Cristina Fernández de Kirchner, postulante à reeleição. Não se sabe bem por que sortilégios, as pesquisas e os prognósticos oficiais já a apresentam como vencedora, apesar das abundantes reações suscitadas contra seu autoritarismo.
Por outro lado, haverá também nos próximos dois meses e meio várias eleições regionais de relevo, de governadores e prefeitos, as quais podem incidir na contenda presidencial. Os candidatos com maior possibilidade de vencer são os opositores. A questão-chave é se os que saírem vitoriosos se articularão ou não nas primárias de agosto numa aliança para enfrentar a Presidente-candidata. Se tal não suceder, é praticamente certo que ela vencerá.
Infelizmente, como é habitual na política partidária, a urgência de uma aliança não significa em absoluto que ela se efetuará. A razão é que os candidatos com poucas possibilidades de triunfo preferem fechar os olhos ao risco de uma derrota, de modo a se tornarem mais conhecidos e tentarem mais à frente novas candidaturas com possibilidades de êxito. Isso sucederá agora, ou o patriotismo de alguns postulantes prevalecerá em certos casos sobre suas próprias ambições, com vistas a apoiar outro com uma opção maior? – Na verdade, em alguns casos, talvez sim; mas dificilmente em todos.
Sucede que, terminado o período presidencial em curso, cumprir-se-ão oito anos de domínio kirchnerista sobre a política argentina. E se a Presidente for eleita, tal domínio se estenderá a doze anos. Como foi esse domínio e quais foram seus frutos? Foi na verdade um domínio sem contrapeso, exercido muitas vezes com a brutalidade decorrente da aliança dos Kirchner com as poderosas centrais sindicais – peronistas de inspiração socialista em geral, nada escrupulosas em matéria ética. E também pelo uso constante e indissimulado dos fundos do Executivo para influir sobre todos os setores da política e das populações das províncias do interior, em especial das cidades pequenas e médias.
As armas do poder foram igualmente usadas incontáveis vezes sem vacilação, seja para jugular a imprensa opositora e enfrentar as classes mais honestas e representativas, seja para a promoção dos setores que praticam a contestação e a agitação, de modo a impulsionar o país rumo ao conflito social e à luta de classes, ou ainda para designar os candidatos do governo, desde que sua lealdade à Presidente fosse a toda prova.
Em decorrência de tais manejos, vários políticos, meios de comunicação e líderes locais importantes, que se haviam manifestado contrários ao casal Kirchner, chegado o momento-chave deram meia-volta, esqueceram as diferenças e se submeteram docilmente à sua vontade. As razões? A julgar pelo que dizem os comentaristas políticos, nada de ideologias, nem de princípios, mas pressões, ameaças, vinganças, alianças de conveniência recíproca, promessas de retribuições, etc.
A consequência é que, segundo o articulista Joaquín Morales Solá, de “La Nación” (10-7-11), de Buenos Aires, “a política opositora é tão errática como é arbitrária a governista. Os opositores nunca se recuperaram do excesso de fragmentação; o governo, por seu lado, confunde um momento político excepcional com o direito perpétuo a mandar sem concessões. [...] Nada penetra, de momento, na envoltura de amianto que cobre a presidente. Tampouco puderam contra essa proteção política nem a já longa escassez de combustíveis nem o método claramente stalinista que usou para dirimir as listas de candidatos. São pequenos fogachos que ninguém sabe quando se converterão em um fogo mais devastador”.
Mas em relação à atual Presidente existem outros pontos questionáveis e questionados, como o aumento desmesurado de seu patrimônio entre 2003 e 2010, ou seja, durante o governo de seu esposo e o dela mesma, o que fez com que a Oficina Anticorrupção (AO) lhe pedisse esclarecimentos. Segundo o jornal “Perfil” (12-7-11), “a chefe de Estado devia apresentar o detalhe de seus bens no dia 4 de julho, mas o responsável da AO, Julio Vitobello, primeiro adiou a data limite até o dia 22 do mesmo mês e depois a estendeu até 22 de agosto, oito dias depois das primárias”. Naturalmente, são muitos os comentários afirmando que, para desmentir seus detratores, ela deveria tornar público esse informe. Mas ela não parece crer que este será precisamente o efeito da difusão de tal informação.
Trata-se assim de um governo cujos desejos e ambições constituem a regra máxima de seu proceder diário; que conduz o país como se fosse sua fazenda pessoal, sem maior respeito pelas leis vigentes, pelas normas de probidade, pelos direitos alheios; que, a exemplo dos demagogos, não fala do bem comum do país senão exclusivamente do bem dos pobres; e que quer satisfazer as conveniências dos pobres às expensas dos que não estão nesta situação, nunca a custo de uma maior austeridade dos funcionários do Estado.

Mauricio Macri venceu o candidato oficial, Sergio Kovadloff, para o governo de Buenos Aires. Uma evidente derrota do kirchnerismo.

Comentando o resultado da recente eleição para o governo de Buenos Aires na qual o opositor Mauricio Macri venceu o candidato oficial, Sergio Kovadloff, escreveu “La Nación” (12-7-11): Filmus [nome do candidato apoiado pela Presidente] foi derrotado antes de tudo pela inconformidade social gerada na cidade de Buenos Aires em decorrência da gestão de seu próprio partido. O oficialismo teria querido que a confrontação na capital fosse entre progressistas e conservadores. A população decidiu que seria entre a lei e a corrupção, entre o espírito de convivência e o afã de beligerância. E votou contra o governo, potenciando a figura de Mauricio Macri em nível nacional. Se os pratos quebrados da derrota foram pagos por um homem que se deixou construir como porta-voz do maniqueísmo governista, os benefícios dessa inconformidade popular recaíram sobre um chefe de governo que soube transmitir um espírito de convivência pacífica e capitalizar em seu favor a agressão inverossímil da que o fez objeto uma presidente empertigada desde sempre a humilhar seus adversários significativos. A regeneração de suas derrotas – um procedimento usual no kirchnerismo – obriga seus porta-vozes a promover um discurso do qual bastaria dizer que é maníaco e tragicômico, se não fosse perigoso. Certamente não é este o melhor modo de avançar por um caminho democrático. Mas é o único possível quando se responde a um projeto autoritário”.
*       *       *
Com os exemplos aqui comentados, vimos como algumas nações vão despencando no abismo, enquanto outras se dirigem para ele. Umas se encontram muito próximas, outras menos. Mas a Divina Providência se vale dessa diversidade de situações para adverti-las dos perigos a que estão expostas, e do que deveriam fazer para livrar-se deles. Condição para poderem viver sob uma ordem e paz social de desigualdades harmônicas, sem esperanças vãs, frustrações ou amarguras.
Que a Santíssima Virgem de Guadalupe, Imperatriz das Américas, obtenha dos saudáveis temores que inspiram o comunismo e o mundo neopagão, um movimento das almas que conduza ao estabelecimento de seu Reino sobre a Terra.

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