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quinta-feira, 6 de outubro de 2011

“A Copa é no Brasil, mas não é para os brasileiros”

“A Copa é no Brasil, mas não é para os brasileiros”

Para o jornalista Jorge Kajuru, a Copa do Mundo de 2014 no Brasil é um evento para turistas. E quem vai pagar a conta é o brasileiro

15/09/2011
Danilo Augusto

da Radioagência NP


Jorge Kajuru - Foto: Reprodução
O Brasil será sede da Copa do Mundo de 2014. Desde 2007, quando o país foi escolhido como sede do mundial, vários questionamentos surgiram em torno desse evento.
Em entrevista a Radioagência NP – parceira do Brasil de Fato – o jornalista Jorge Kajuru afirma que o país tem plenas condições e estrutura para realização do evento. Porém, relata que o problema da Copa ser no Brasil está relacionado “à crise moral dos representantes.” Ele critica o financiamento através de dinheiro público do BNDES no evento e pede mais postura da presidenta Dilma sobre o tema. Para Kajuru, a Copa é no Brasil, mas não é para os brasileiros. E acrescenta: “É uma Copa para turistas. Quem vai pagar a conta é o brasileiro, vai sair do imposto”.
Conhecido por sua coragem de enfrentar os cartolas do futebol, Kajuru também detalha a relação entre a Federação Internacional de Futebol (Fifa) e o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ricardo Teixeira, a qual ele descreve como “ladrões públicos do futebol mundial.” O jornalista também acusa a Rede Globo. “O Ricardo Teixeira também é intocável pela proteção da Rede Globo de Televisão”. Segundo ele, a emissora é sócia em negócios envolvendo futebol, principalmente, monopólio e exclusividade de transmissões. Leia a seguir a entrevista.

O Brasil será sede da Copa do Mundo de Futebol de 2014. Como você avalia a realização deste evento em nosso país?
Jorge Kajuru – Não sou contra a Copa do Mundo no Brasil. O país tem condições e estrutura. O problema da Copa ser aqui não é estrutural, e sim, de crise moral. Vão roubar de nós brasileiros, pagadores de impostos, porque sairá de forma pública a maior parte do dinheiro gasto na Copa do Mundo. O governo federal, em pleno o governo do presidente Lula, teve que assinar um documento no qual a Fifa ganhará todo o dinheiro da Copa sem pagar qualquer centavo de tributos. A Fifa aceitou o Brasil como sede da Copa tendo essa condição como base de negócio. Todo dinheiro faturado aqui ela (Fifa) vai levar para a Suíça e fazer a divisão entre os ladrões públicos do futebol mundial.

Você já declarou que vai torcer contra a seleção brasileira na Copa. Por quê?
Vou torcer contra o Brasil na Copa de 2014. Também vou rezar para que na final o Brasil esteja, e que, exatamente na final, o Brasil perca de forma vergonhosa. E que haja, no Maracanã, com o segundo maracanasso, um linchamento público verbal contra a fi gura do senhor Ricardo Teixeira. O estádio inteiro em eco para que ele criasse vergonha na cara e deixasse a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e também o Brasil, e se juntasse ao seu bando e quadrilha lá da Suíça.

A realização da Copa demanda um investimento financeiro muito alto. Grande parte vem por meio do financiamento do BNDES. Você é a favor de financiamento público em um evento, que como você disse, terá o lucro dividido em meios privados?
A Copa é no Brasil, mas não é para os brasileiros. É uma Copa para turistas. Quem vai pagar a conta é o brasileiro, vai sair do imposto. O BNDES já colocou R$ 4,8 bi na Copa. Até 2014 pode dobrar esse valor. O mais grave é que quando foi definido o Brasil como sede da Copa, fi cou estabelecido de forma pública, para todos os brasileiros – nas palavras do então presidente Lula e do Ricardo Teixeira – que não se gastaria nenhum centavo público para Copa do Mundo, que todas as despesas seriam privadas. O governo e o Ricardo Teixeira mentiram, foram canalhas.

E como você avalia o papel da presidenta Dilma neste processo?
O que ela disse foi o mais grave. A presidente Dilma afirmou que não poderia divulgar os valores fi nanceiros gastos pelo governo até 2014, que eram informações sigilosas. Isso é revoltante. Qualquer brasileiro minimamente sério, qualquer jornalista minimamente descente e qualquer veículo de comunicação minimamente ético teriam que cobrar da presidente essa postura lamentável. Não pode gastar dinheiro público e não informar e divulgar para onde foi.


Manifestantes pedem saída de Ricardo Teixeira na avenida Paulista
Foto: Guilherme Zocchio
Recentemente, o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, recebeu uma série de acusações. Mesmo assim, ele continua impune. Por que essas acusações não surtem efeito internacionalmente, dentro da Fifa?
O Ricardo Teixeira é blindado porque ele faz parte da quadrilha da Fifa. Ele é intocável porque é sócio do Joseph Blatter [presidente da Fifa] e protegido por João Havelange, presidente de honra da Fifa e dono da máfia do futebol internacional. Havelange e Ricardo Teixeira são donos da Traffic – a empresa que detêm os direitos internacionais de venda de transmissão de futebol para veículos de comunicação do mundo inteiro. A Traffic não é do jornalista Jota Ávila. O Jota é “laranja” do Havelange e do Ricardo, a imprensa esportiva sabe disso é ignora de forma vergonhosa.

E no âmbito nacional, por que nada acontece?
Primeiro porque o povo brasileiro não tem coragem de protestar. O povo brasileiro é uma decepção no que se refere a protesto contra coisas públicas horríveis. Ninguém tem coragem de falar isso, falar isso é brigar com o povo, mas não faço média com o povo. Amo o povo porque é a maior celebridade deste país, é feliz recebendo um salário mínimo de R$ 600. Mas não vou dizer que o povo tem cultura de protesto. O Ricardo Teixeira também é intocável pela proteção da Rede Globo de Televisão. A Globo é sócia em negócios envolvendo futebol, principalmente monopólio e exclusividade de transmissões. Isso se chama ditadura da audiência.

Mas a Globo não vende direitos de transmissão para a Bandeirantes?
A Band não paga pelos direitos de transmissão. Ela é presenteada pela Rede Globo desde que, editorialmente, cumpra as mesmas regras da Globo para com o Ricardo Teixeira.

Muitas pessoas defendem que a CBF teria uma melhor gestão se as eleições fossem mais democrática, com participação popular. Você concorda com essa proposta?
Tudo isso não passa de uma fantasia neste Brasil dirigido e presidido por quem é. O PT fará com que a CBF se perpetue com esses mesmos canalhas que estão lá. Embora o ex-presidente Lula – nas eleições de 2002 – tenha prometido que tiraria o Ricardo do comando do futebol brasileiro e que abriria a caixa da CBF. Foi mentira dele. No primeiro mês de governo ele já era melhor amigo do Teixeira. Ninguém é amigo do Teixeira sem que financeiramente tenha nenhum benefício. Portanto, o PT como partido político deve ter ganhado muita grana do futebol brasileiro – da CBF. É um sonho essa história de eleição direta, do povo votando.

E qual a participação das federações, dos clubes e da Rede Globo nesse processo de permanência do Ricardo Teixeira dentro da CBF?
As federações são Ricardo Teixeira. Já nos clubes isso não acontece mais. Na última votação para escolher o presidente do Clube dos 13, a CBF e a Rede Globo tomaram uma derrota vergonhosa. Eles queriam uma vitória do Cleber Leite contra o Fábio Koff. E como isso não aconteceu, o São Paulo foi punido, o Morumbi foi punido e não será sede de abertura da Copa do Mundo. O Ricardo Teixeira, ao lado do seu amigo Andrés Sanchez – presidente do Corinthians – não quiseram. Se o país fosse sério, Andrés e Ricardo Teixeira estariam presos. É por isso que agora a Rede Globo quer tirar o Fábio Koff do comando dos 13 e ameaça acabar com o Clube e montar uma Liga Nacional para mandar mais ainda no futebol brasileiro.

Recentemente, a Rede Record entrou na disputa com a Globo para transmitir jogos do campeonato Brasileiro. Essa quebra de monopólio seria boa para o futebol?
Não existe nenhuma diferença na maneira em que Record e Rede Globo cresceram e se transformaram em império. A Globo nasceu de um escândalo chamado Time Life e a Record se transformou em império com dinheiro de fiéis. Acrescente, além do monopólio, a expressão ditadura de audiência. Mesmo não havendo diferença, também na parte editorial, é preciso reconhecer que a proposta da Record é três vezes maior. E ainda, a Record garantia que o jogo, em sua grade de programação, seria às 20h e não às 22h. Hoje, ainda temos que esperar a novela acabar para começar um jogo. Pior, esses jogos acabam meia noite ou 1h quando já não tem mais transporte público. Isso é um absurdo, um crime. Tudo ficou na mesma e seja o que Deus quiser.

Qual o papel da Rede Globo e dos veículos de comunicação no Brasil para que essas mazelas do futebol se perpetuem?
O papel da Globo é somente o dinheiro. Quanto ao papel dos demais veículos de comunicação deveria ser o jornalismo. A imprensa foi feita para servir o povo, e não se servir do povo. E o que acontece com a maior parte da imprensa, nesta questão que estamos debatendo aqui, é que a imprensa está se servindo do povo. São raras as exceções que não fazem isso, como a ESPN, o jornal o Lance. Também existem alguns jornalistas independentes, como o Juca Kfouri. Poucos veículos ousam falar de Ricardo Teixeira. O problema é que as grandes empresas brasileiras também são amigas do senhor Teixeira. E são todas calhordas quanto Ricardo Teixeira essas grandes agências de publicidade, esse monopólio de grandes empresas que só anunciam em veículos que não praticam o jornalismo esportivo independente, investigativo, sério e decente. É mais que uma máfia, é um cartel.

Muitas pessoas te classificam como um pessimista e inimigo do futebol. Você realmente gosta deste esporte?
Tem pessoas que me consideram um crítico, um louco, um do contra e um pessimista. Eu amo o futebol nas quatro linhas. Quem não vai gostar de um drible do Neymar [Santos Futebol Clube]? Uma bela jogada e um passe de calcanhar do jogador Ganso [Santos Futebol Clube] e do Lucas [São Paulo Futebol Clube]? Ninguém vai me fazer deixar de gostar, de ver e de falar bem do bom futebol. Vou defender e aplaudir jogadores e treinadores acima da média. Agora não queiram que eu dê uma entrevista e que deixe de falar em relação a essa escumalha que comanda o futebol brasileiro. Se eu não denunciasse isso eu não seria um jornalista, e sim, um picareta e assessor do Ricardo Teixeira. Mas o futebol dentro de campo é minha paixão e alegria. (Ouça o áudio desta entrevista na Radioagência NP)

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