Celso Brasil
O câncer de Lula
Por Rodrigo Constantino
Eu dei meu apoio a esta iniciativa, que gerou forte reação de muitas pessoas, alegando que não se deve “brincar” com a saúde alheia.
Pretendo justificar minha postura com mais argumentos, até porque há gente desonesta espalhando mentiras por aí e distorcendo tudo sobre o assunto.*
Em primeiro lugar, acredito que quem sempre brincou com a saúde dos outros foi o próprio Lula, inclusive quando fez declarações absurdas como esta da “perfeição” da nossa saúde pública, ou quando disse que dava até vontade de ficar doente para ser atendido por uma UPA.
Trata-se de piada de mau gosto, um escárnio que machuca todos aqueles que dependem efetivamente do SUS.
O que a campanha intencionava, portanto, era expor esta hipocrisia, esta incoerência do maior populista que este país já teve, disposto a qualquer tipo de bravata verborrágica para ficar no poder.
Será que aqueles que se sensibilizam com a doença do ex-presidente agora estavam tão preocupados assim com os milhões de brasileiros que sofrem diariamente nas precárias condições dos hospitais públicos, muitos morrendo desnecessariamente, enquanto Lula repetia aquelas atrocidades com fins eleitoreiros?
Mas argumenta-se que doença não deveria ser uma forma de “vingança” política.
Pode ser.
E rebato aqui as acusações de que é abjeto desejar o mal a pessoas apenas porque divergimos delas ideologicamente.
Não é este o caso quando se trata de Lula.
Eu divirjo de muitas pessoas, e não as desejo mal algum.
A divergência intelectual é até saudável dentro de certos limites, e a tolerância é uma bandeira liberal que sempre abracei.
O problema não é “apenas” discordar de Lula nas idéias; o problema é o estrago concreto que o próprio Lula faz ao país e aos brasileiros, com sua demagogia e imoralidade.
Em escala diferente, creio que muitos venezuelanos não derramaram lágrima alguma com o câncer do tiranete Hugo Chávez.
Ah, mas Lula não é um ditador!
Verdade, mas não por falta de vontade e desejo, e sim porque as nossas instituições, que ele tanto ajudou a enfraquecer, não permitiram.
E aqui cabe responder também aos que afirmam, seguindo a tradição cristã, que não devemos desejar o mal de ninguém.
Odeie o pecado, mas ame o pecador!
Será que isso pode ser realmente levado a sério?
Ou será que há muita hipocrisia nesta postura “humanista”?
Podemos fazer um teste: quantos esquerdistas sensibilizados pela doença de Lula reagiriam da mesma forma se fosse Bush o doente?
Sejam sinceros, companheiros!
Ou nem precisam responder: sabemos como os petistas reagiram ao comando do “chefe de quadrilha”, que mandou agredirem até fisicamente Mário Covas, que na época tinha câncer.
Se fosse Sarney o doente hoje, haveria a mesma comoção nacional para defendê-lo das campanhas irônicas?
Dois pesos e duas medidas. Logo se vê que este “humanismo” todo não passa de jogo de cena.
Não acho que o respeito seja algo grátis nessa vida. Acredito que devemos conquistá-lo. Alguns pensam que devemos respeitar ou até amar mesmo o ser mais abjeto do planeta.
Ame o próximo como a ti mesmo.
Nunca compartilhei desta máxima. Acredito que ela agride o que há de mais básico em nossa natureza.
Penso que, ao suspender o julgamento e colocar todos no mesmo saco do respeito imerecido, estamos sendo injustos com as pessoas decentes.
Há que se separar o joio do trigo.
Isso pode não ser sinônimo de desejar o sofrimento daqueles que julgamos pessoas desprezíveis. Mas também não quer dizer que vamos nos preocupar tanto com elas. Eu não ligo para a saúde dos traficantes. Eu não ligo para a saúde de caudilhos que espalham desgraças por onde passam.
A morte costuma transformar todos em santos.
Biografias são escritas refazendo a história.
Surge uma aura de inocência concomitantemente ao cadáver.
Nunca aceitei isso.
E sei que, no fundo, ninguém aceita.
É questão apenas de grau.
Ou alguém vai falar bem de Hitler só porque ele morreu?
A doença e o sofrimento costumam despertar o mesmo tipo de reação. Mas o cancro que se espalha pelo corpo não transforma um canalha em um homem bom. Um pulha com câncer continua sendo um pulha. Pode até ser politicamente incorreto dizer isso, mas não deixa de ser verdade. O contrário é apelar para a hipocrisia.
Voltemos à doença de Lula. Eu confesso abertamente: ela está na rabeira de minhas preocupações. Não consigo sentir pena dele, ainda que me esforce.
Isso me faz alguém insensível?
Não!
Apenas seleciono quem é digno de minha preocupação.
Antes de Lula, fico bem mais preocupado com os milhões de brasileiros decentes que sofrem com os serviços públicos caóticos, a despeito dos trilhões que governantes arrecadam e desviam para fins eleitoreiros ou corruptos.
Lula, convém lembrar, representa o que há de pior em nossa política. Não satisfeito, ainda fez questão de afrontar todos os que dependem do SUS quando chamou o modelo de “quase perfeito”. Isso deveria sensibilizar as pessoas.
Não aceito ser pautado pela sensibilidade seletiva dos “humanistas” de plantão.
Posso até não celebrar a doença e o sofrimento de uma pessoa, por mais que ela possa merecer certo castigo “divino” (principalmente quando o castigo das leis humanas não existe).
Mas também não vou transformar uma doença, por mais trágica que possa ser, em um salvo-conduto para limpar a sujeira grudada em indivíduos que viveram uma vida praticando o mal contra inocentes, disseminando o ódio e segregando as pessoas para conquistar o poder.
O lulopetismo é um câncer para o Brasil. Esta “doença” me incomoda muito mais do que a doença do ex-presidente.
Claro que o ideal seria derrotar este projeto populista e autoritário de poder nas urnas, ou ter instituições decentes para punir os corruptos do governo (até hoje os mensaleiros nem sequer foram julgados!).
Mas não serei hipócrita a ponto de demonstrar uma preocupação que não consigo sentir em relação àquele que desprezo como ser humano, por representar tudo que condeno em termos de valores e princípios.
A acusação mais patética de todas, aliás, fala de preconceito contra Lula.
Preconceito contra o que?
Tem vários nordestinos ou trabalhadores humildes que subiram na vida, de forma honrosa. Não foi o caso de Lula.
Preconceito, ou melhor, pós-conceito eu tenho contra corruptos, demagogos, populistas, bajuladores de tiranos assassinos, etc.
Perto de minha casa há um indigente que não parece nada bem de saúde. Sua situação me incomoda infinitamente mais do que o câncer de Lula.
As “almas sensíveis” que saíram em defesa de Lula e contra a campanha pelo tratamento no SUS – como se isso fosse o maior castigo do mundo, ou seja, os próprios petralhas rejeitam a saúde pública que Lula considera “quase perfeita” – mas, dizia eu, as “almas sensíveis” sofrem pelo indigente?
Ou só o ex-presidente merece tantas orações?
Eu considero legítimo usar a doença de Lula para expor sua hipocrisia desrespeitosa aos milhões de brasileiros que, de fato, precisam se tratar no SUS, pois não são ricos como o milionário Lula, que busca tratamento no melhor hospital do país, enquanto ainda ousa falar em nome de todos os trabalhadores pobres brasileiros, como se fosse um deles.
Chega de tanta hipocrisia!
* O Relatório Reservado, um “newsletter” de fofocas empresariais, publicou um comentário venenoso sobre mim, com o título “Ave agourenta”.
Diz ele: “Tomara que o Facebook não forme opinião. O colunista de O Globo Rodrigo Constantino postou ontem com vigor homicida comentário do qual não só comparava Lula a Hitler como torcia pela morte do ex-presidente. Depois reclamam que o PT quer censurar a imprensa...”.
Quantas falácias.
Usei Hitler apenas para mostrar que há claros limites para nosso “humanismo”, ou seja, não desejamos a boa saúde de todos os seres humanos, ao contrário do que alguns disseram.
E jamais torci pela morte do ex-presidente.
Disse apenas que ele deveria ser coerente e buscar tratamento no SUS.
O autor do comentário deve achar que isso é suicídio, mas deveria reclamar com o próprio Lula, que pensa o contrário.
Do alto de sua perfídia, o autor ainda usa meu comentário no Facebook como justificativa para o PT defender a censura da imprensa.
Também, esperar o que de um jornaleco que diz, cheio de orgulho, que “Seu número zero foi uma carta da indústria nacional contra o perigo das importações, o que já apontava para sua posição editorial de viés nacionalista”?
É dureza...
Rodrigo Constantino é formado em Economia pela PUC-RJ, e tem MBA de Finanças pelo IBMEC. Trabalha no setor financeiro desde 1997. É colunista da revista Voto, do caderno Eu&Investimentos do jornal Valor Econômico, do jornal O Globo e do site ordemlivre.org. Ele também é membro-fundador do Instituto Millenium e diretor do Instituto Liberal.
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